A visita de Francisco à Polónia

|Hélio Bernardo Lopes|
Terminou a visita do Papa Francisco à Polónia, naturalmente com um êxito pastoral seguro. E acompanhei, embora medianamente, esta sua visita, ficando a par da respetiva trajetória. Como usualmente, tenho aqui de referir o que penso ter sido uma lacuna, enferma de alguma inoportunidade. 

Há muito pouco tempo, Francisco visitou a Arménia, e foi com grande satisfação que lhe ouvi uma referência forte e clara ao genocídio de perto de um milhão arménios às mãos dos militares turcos. Fiquei naturalmente satisfeito, porque a voz de um Papa, nestas circunstâncias, ajuda ao recuo do esquecimento histórico-geracional.

Ora, desta vez, tendo o Papa Francisco visitado e orado em Aushwitz, faltou uma referência ao massacre perpetrado por polacos católicos e nazis em Varsóvia, quando incendiaram certa catedral em cujo interior se haviam refugiado mais de um milhar de judeus de todas as idades e géneros. E é bom não esquecer o modo colaboracionista que os polacos rapidamente adotaram logo após a invasão nazi, ato que pôs em marcha a Segunda Guerra Mundial. Acontece que só pôde chegar-se a esta realidade em virtude da atitude tolerante e lenta da França e do Reino Unido, que tudo foram aceitando a Hitler e ao seu bando nazi e criminoso. Sempre o Ocidente esperou que a loucura de Adolfo Hitler projetasse a Alemanha contra a União Soviética de então, mas essa tática saldou-se no desastre que depois se viu e tão bem se conhece.

A este propósito, e até em face do que já hoje pode voltar a ver-se, cito aqui uma passagem do CURSO DE RELAÇÕES INTERNACIONAIS, do académico José Adelino Maltez, publicado pela Principia, na sua página 82: Uma dessas obsidiantes divisões do mundo, também ditas fraturas, ou clivagens, prende-se com o chamado conflito Oeste/Leste, com essa perspetiva consolidada durante uma chamada Guerra Fria, durante a qual se teria oposto o mundo livre ao dito comunismo, mas se retomou uma mais antiga dicotomia Ocidente/Oriente, uma questão que nunca teve a ver com formas de oposição entre entidades geográficas, mas sim com disputas entre formas espirituais nas quais sempre predominou uma espécie de russofobia. Trata-se, para mim, uma evidência objetiva e indiscutível, também por mim exposta desde há muito em escritos meus diversos.

Por tudo isto, tenho pena que o Papa Francisco tenha deixado de lado o massacre antes referido, ficando-me a dúvida sobre se referiria, numa sua visita à Croácia, o genocídio de duzentos mil sérvios ortodoxos por croatas católicos, alinhados com Hitler e o seu bando nazi e criminoso, e sob o comando de um bandido da estirpe de Ante Pavelic, que nunca foi presente a juízo e condenado, refugiando-se no Vaticano durante cerca de dois anos, acabando por ficar a viver na Espanha de Franco, onde faleceu sem ser julgado. E também não esqueço o silêncio do mundo de então, incluindo o de Pio XII, ao redor do que se conhecia sobre os campos de concentração.

Termino com as palavras de um antigo professor meu de Religião e Moral, o padre Manuel Gabriel da Costa Maia, acabados de sair da aula e já em pleno corredor: Hélio, nós podemos dizer dos judeus muita coisa, mas há um dado que tem de reconhecer-se, é que eles conhecem a sua doutrina, o que não se dá com os católicos.

Nunca tendo duvidado de tal realidade, e reconhecendo que o padre Costa Maia era um homem bom e probo, e muito meu amigo – a inversa também era verdadeira –, levanta-se-me esta questão: o que pretendia ele dizer com a expressão “nós podemos dizer dos judeus muita coisa”? Não tenho, para mim, um ínfimo de dúvida, compreendendo-a, precisamente, com o silêncio de Pio XII e da Igreja Católica, com mui raras exceções.

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