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|Hélio Bernardo Lopes| |
É hoje extremamente elementar perceber que tiveram lugar quatro fases distintas na intervenção política do Presidente Cavaco Silva, sempre marcadas por diferendos ou apoios determinados pelas forças políticas à frente da governação e pela sua situação envolvente.
Em primeiro lugar, a fase inicial da sua primeira presidência, com José Sócrates e o PS ao leme da governação, mas com Luís Marques Mendes na liderança do PSD. Foi uma fase de aparente simpatia, embora sem uma colaboração institucional, dado que nunca a mesma se mostrou necessária.
Acontece que as coisas são como são e que Luís Marques Mendes, naturalmente personalidade considerada pelo Presidente Cavaco Silva, simplesmente não ia lá. Sucediam-se as medidas políticas do Governo de Sócrates, sem que PSD e CDS/PP descolassem nas inúteis sondagens. Cá fora, ao nível da população, reconhecia-se a necessidade de tirar Luís Marques Mendes da liderança laranja, mas ninguém com real poder surgia a sugerir tal ideia. A verdade é que este Luís lá se determinou a sair, sendo seguido do seu homólogo Filipe Menezes. E aqui tudo foi logo diferente, com as históricas linhas cavaquista e de Cascais a zurzir, dia sim, dia sim, no bom do Luís Filipe Menezes e no seu secretário-geral, Ribau Esteves.
Foi um tempo em que estes dirigentes do PSD conheceram bem o que é sofrer a obstrução de uma minoria com objetivos estratégicos ou bem instalada socialmente, sempre com um olhar de soslaio sobre nortistas.
Num ápice, percebendo a realidade que então desabrochava, Luís Filipe Menezes tomou a decisão de vir o seu PSD, na Assembleia da República, a solicitar uma auditoria ao Banco de Portugal. Bom, foi o bom e o bonito, com companheiros seus à beira de um verdadeiro ataque de pânico, sabedores de como tal aventura só tinha um começo conhecido…
Até ameaças de morte chegaram a surgir sobre Luís Filipe Menezes. Lamentavelmente, este limitou-se a acender a luz sobre este tema, mas para logo a desligar. Até hoje, já no Conselho de Estado, lugar sempre frequentado com grande agrado, pompa e, quase com toda a certeza, também inutilidade.
Até aqui, pois, tudo corria normalmente, nem bem nem mal, entre o Presidente Cavaco Silva e o então Primeiro-Ministro, José Sócrates. Simplesmente, Luís Filipe Menezes acabou por claudicar, entrando para o seu lugar Manuela Ferreira Leite. Era a grande esperança inicial do PSD, porque em pouco tempo se percebeu que Manuela estava a anos-luz de ser uma figura com real projeção política sobre o nosso tecido social. Num país conservador, Manuela Ferreira Leite tinha até o mau condão de ser mulher, para mais com as mulheres como suas principais adversárias no voto. Bom, perdeu também as eleições para José Sócrates.
Em segundo lugar, as novas relações do Presidente Cavaco Silva com José Sócrates, com a vitória de Manuela Ferreira Leite, tinham-se tornado simplesmente terríveis, confirmando a documentação histórica que apenas o Presidente da República usava da palavra em condições objetivamente adversas contra o Primeiro-Ministro, nunca o contrário. Foi o tempo das inenarráveis escutas a gente do Palácio de Belém, dos encontros entre jornalistas em condições estranhas, do discurso presidencial da sua tomada de posse para o seu segundo mandato e da completa ausência de contribuição presidencial para que se encontrasse um qualquer consenso entre PS e PSD.
Em terceiro lugar, o tempo que se iniciou com a chegada ao Governo da anterior coligação entre o PSD e o CDS/PP, já maioritária na Assembleia da República. Bom, foi uma fase de cabalíssimo apoio do Presidente Cavaco Silva à coligação da Direita, já situada a anos-luz da social-democracia ou da democracia-cristã. Tudo passou a valer, sempre apoiado pelo Presidente da República, e sempre em nome da legitimidade derivada da existência de uma maioria parlamentar de suporte à governação. Simplesmente, os portugueses cansaram-se, embora não tenham prestado grande atenção a uma campanha do PS realmente mal organizada. Para mais com toda aquela intervenção da ala direitista do partido, ao redor dos ditos seguristas. Por um acaso da vida, uma quinta coluna que só serviu para tornar mais clara a má intervenção política do Presidente Cavaco Silva.
E, em quarto lugar, esta mais recente fase, verdadeiramente inenarrável do ponto de vista político. Há mesmo uma boa imensidão de concidadãos nossos que a interpretam como uma espécie de gozação: com o PS e os partidos da Esquerda, mas por igual com os portugueses que deram o seu voto àqueles partidos políticos.
É hoje essencial que se realizem estudos sobre a intervenção presidencial de Aníbal Cavaco Silva e de como esta contribuiu, de um modo decisivo, para degradar a imagem pública da democracia e do funcionamento das instituições políticas do País. Um facto que é tanto mais grave quanto o mundo dá todas as indicações de estar a caminhar para uma guerra fratricida, naturalmente criada pelos Estados Unidos.
Tudo isto, porém, nunca teria tido lugar se outro tivesse sido o candidato a vencer aquela primeira eleição que levou Aníbal Cavaco Silva ao alto cargo de Presidente da República. Como escrevi já muitas vezes, uma revolução tem o dever de se defender, pelo que, tendo presente a vitória de Salazar no concurso sobre O MAIOR PORTUGUÊS DE SEMPRE, é essencial não voltar a cair no terrível erro de substituir o atual Presidente da República por um outro, oriundo da mesma área política. O desastre que se criou, embora surgido por via de causas externas, só foi possível por ser o Presidente da República um concidadão nosso oriundo da área da Direita. É essencial ter interesse pela vida pública, atenção e bom senso. De contrário, tudo será como nestes dez últimos anos perdidos.