|Hélio Bernardo Lopes| |
Em primeiro lugar e com elevada probabilidade, o leitor está desiludido com a vida política do País. E está nesta circunstância pelo facto de ter vindo a perder qualidade de vida e a ganhar incerteza ao longo destes quatro anos de ação da atual Maioria-Governo-Presidente. Simplesmente, desde que se pretenda tratar desta realidade com verdade, poucos poderão dizer que desconheciam que esta seria a realidade que viria a ter lugar com os resultados eleitorais de há nove anos e de há quatro.
Em segundo lugar, o leitor não pode dizer que é por desconhecer quem são os deputados eleitos pelo seu círculo eleitoral que tudo lhe corre pior, porque conhece muitíssimo bem os principais detentores do que resta da nossa soberania e nem por isso lhes pode dirigir a palavra. Nem mesmo que pudesse faze-lo teria um resultado diferente, porque de há muito a democracia está reduzida a um mero ritual que já poucos dos seus praticantes valorizam.
Em terceiro lugar, o atual Sistema Político, para lá de muito funcional, é também muito representativo do sentimento político dos portugueses. De um modo muito forte, os resultados dos votos têm uma boa representação ao nível dos mandatos. Um facto que, naturalmente, constitui um fator justificador da vontade de votar. Em quarto lugar, os portugueses estão hoje muito identificados com o atual Sistema Político, de que nunca se ouviram queixas, mesmo que mínimas, ao nível da população. O que significa que uma mudança profunda do Sistema Político criará um acrescido desinteresse dos portugueses pela vida política. Será mais uma referência do espírito democrático que nasceu com o dealbar da III República que se perderá de um modo forte.
Em quinto lugar, a crescente abstenção tem como causa principal o reconhecimento objetivo, operado pela generalidade da população, de que a sua qualidade de vida está a baixar para um nível que é inteiramente determinado por fatores que são completamente alheios ao sentimento geral da população e muito menos ao seu consentimento explícito e referendado. Tudo se decide em segredo e à revelia do que possa ser a vontade dos portugueses em domínios extremamente estratégicos, para si e para o País.
Em sexto lugar, a também muito má qualidade do Sistema de Justiça, sobre cujos resultados se conheceram há pouco críticas muito fortes e de há muito identificadas pela comunidade nacional. Uma perceção hoje completamente instalada no tecido social português e de que se percebe não ser fácil o surgimento de uma porta de saída.
Em sexto lugar, o facto, já cabalmente reconhecido de há muito, que, a não ser o Tribunal Constitucional, desde que instado a tal, a ação da governação é completamente incontrolável. As mudanças que se anunciam na comunidade de informações, bem como um primeiro passo na militarização da vida política, através da utilização de concidadãos oriundos do meio militar no exercício de tarefas do foro civil – traz-me ao pensamento o tristemente célebre caso dos gorilas, no período final da II República –, são indicadores da falência completa da atual governação, infelizmente muito levemente contestados pelo PS.
E, em sétimo lugar, o cabalíssimo silêncio ao redor do acordo entre a União Europeia e os Estados Unidos, que trará gravíssimas consequências para os portugueses e para a generalidade dos europeus. Se a isto juntarmos que Mário Soares defendia que Salazar devia ter consultado os portugueses sobre a defesa das antigas províncias ultramarinas, bom, percebe-se a mudança de um ângulo raso que está a sofrer a vida dos portugueses. Hoje, de um modo dito democrático, a vontade dos portugueses é completamente desprezada. Realidades a que há que adicionar a certeza empírica dos portugueses de que um futuro estável e digno não chegará nas próximas décadas.
E já mesmo por fim, o nefando papel da grande comunicação social, que pouco ou nada realiza de útil para os portugueses, mormente ao redor dos casos mais importantes, como se dá com o perigosíssimo acordo Euro-Atlântico. E também com a completa e perigosa mudança do Sistema Político.