|Hélio Bernardo Lopes| |
Só um tolo pode imaginar que um Estado não é espiado por um outro seu aliado. Basta recordar as palavras de George Schulz, quando era Secretário de Estado dos Estados Unidos, a propósito da utilização por Israel de um judeu que trabalhava na CIA e espiava para o Estado Judaico: caramba, estes tipos até a nós são capazes de espiar! Quem pode espiar, espia sempre, seja aliado ou inimigo. E se a um aliado convier, pode mesmo fornecer os dados obtidos a um inimigo do seu aliado. Em espionagem vale sempre tudo. Os Estados Unidos, supostamente um aliado de Portugal, recebiam Holden Roberto às escondidas, com o falso nome de José Gilmore, situação que o Governo Português lhes estampou na cara.
De molde que o Primeiro-Ministro Manuel Valls bem podia, com o seu presidente e com o seu Governo, deitar-se a praticar uma boa política, mas virada para a defesa da dignidade do povo grego, ou para a proteção dos refugiados que vêm tentando fugir do horror e do terror, no lugar de fechar a fronteira com a Itália. E também evitando a triste figura de um segunda linha em face da Alemanha, ou de um alinhadinho obediente com os Estados Unidos nas provocações à Rússia, e que levaram a guerra à Ucrânia, hoje dirigida por uma marioneta do Ocidente.
Quem teve a oportunidade de acompanhar as excecionas séries televisivas francesas, OS INFLUENTES e UM CRIME, UM CASTIGO, ou quem sabe o que se praticou no tempo de De Gaulle na sede da Gendarmerie contra cerca de meia centena de argelinos detidos, de imediato assassinados e com os corpos logo deitados ao Sena, ou quem recorda o vergonhoso colaboracionismo com Hitler e com os nazis durante a II Guerra Mundial, percebe perfeitamente o ridículo desta tomada de posição de Manuel Valls.
Se Manuel Valls acha inaceitável a espionagem dos Estados Unidos sobre os líderes da França, será conveniente que comece a sua justiça por esclarecer, por exemplo, o que esteve por detrás daquele horroroso homicídio de Muamar Kadafi... De resto, e como pude já referir, o que é normal entre Estados é o que é conveniente a cada um deles. Aliás, a França, até quando tem razão, nunca é de fiar. Nem é a primeira vez que algo de similar tem lugar, porque os Estados Unidos, sempre tendo desconfiado de De Gaulle, e lembrando o colaboracionismo dos franceses com os nazis alemães, chegaram a preparar-se para assassinar o próprio De Gaulle, ao descobrirem que a França trabalhava para obter a bomba nuclear.
Claro que a França tem aqui razão, mas tem de olhar para trás e recordar que nunca se pode confiar capazmente nas instituições francesas. Aliás, Chirac acabou por ser condenado, de Sarkozy falta esclarecer o que se passou com o financiamento por Kadafi e com o homicídio deste, e com Hollande nunca poderá esquece-se que saía de noite, numa motoreta, disfarçado, para se ir encontrar com uma senhora...