![]() |
| |Hélio Bernardo Lopes| |
A uma primeira vista, ficava a sensação, nos incautos que tivessem ouvido as referidas considerações, que nada de similar teria lugar em Portugal. Simplesmente, nestes domínios, e nos dias que passam, o número de portugueses incautos é já muitíssimo limitado. A generalidade dos portugueses conhece muitíssimo bem a sociedade em que vive e já não vai neste tipo de cantilenas. Pode fingir não ver, nem ligar ao que se passa, mas está a anos-luz de tomar tais soporíferos.
Sem um mínimo de espanto, eis que nos chegou, ontem mesmo, a notícia de que a secção chinesa da INTERPOL deu a conhecer uma lista com os nomes de cem altos responsáveis acusados de corrupção e que terão fugido para o estrangeiro.
Acontece, porém, que as autoridades chinesas já publicaram todos os dados identificadores dos foragidos. A lista com toda a sua identificação está publicitada na página oficial da Comissão Central de Inspeção e Disciplina, entidade oficial chinesa que superintende no combate à corrupção. Tudo, portanto, com a máxima transparência e a anos-luz do que tem lugar, de um modo muito geral, na União Europeia.
Ora, onde foram estes foragidos procurar o seu refúgio? Pois, nos Estados Unidos, Canadá, Nova Zelândia, Reino Unido, França, Tailândia, etc.. Tudo, pois, Estados onde está omnipresente a democracia e o neoliberalismo e que se autoproclamam de espaços de exemplaridade. Enfim, cá ficamos à espera dessa grande manifestação da cooperação transnacional em matéria de combate à corrupção...
Igualmente significativo é o que tem vindo a ter lugar em Baltimore, nos Estados Unidos. Depois de mais uma morte de um preto norte-americano, desta vez no interior de uma esquadra de polícia, os guardas foram suspensos, aguardando-se uma explicação forense para dentro de um a dois meses. Um mimo... Sobretudo em face do que se passa na China.
O interessante, na sequência do regresso do racismo à sociedade norte-americana, materializado nesta amplíssima sucessão de mortes de pretos às mãos da polícia, é olhar o que de tudo isto nos conta a nossa grande comunicação social, em especial a televisiva: nem um documentário, em horário nobre, sobre a onda de mortes de pretos que vem tendo lugar nos Estados Unidos às mãos da polícia, sendo que o que acaba por ser realçado é que foram feridos uma dezena de polícias, um deles com gravidade...
Um instante mais, e aí nos chegou a notícia da recente cimeira contra as redes de tráfico de pessoas. Sobretudo, oriundas no continente africano para o espaço da União Europeia, tal como se vem vendo desde há muito. E quem participou nesta cimeira? Pois, os titulares da Administração Interna de Portugal, Espanha, França e Marrocos. Parece que se propõem criar equipas conjuntas de cooperação policial junto dos postos chave das principais rotas de imigração, defendendo ações firmes contra as redes de exploração de imigrantes. Uma realidade que me deixou admirado, porque ainda cheguei a imaginar que se proporiam delimitar uma estratégia para levar os Estados africanos para uma rota consolidada e continuada rumo ao desenvolvimento. Debalde.
E como quando há muitas, há ainda muitas mais, também o Japão pretende agora alinhar num regresso ao passado. De molde que o seu Governo, sem estar com meias medidas, certamente aí apoiado pelos Estados Unidos, pretende agora reescrever o que foram as agressões do Exército Imperial em países vizinhos antes e durante a última Guerra Mundial, mas por igual rever a Constituição do país, que é (por enquanto) um documento pacifista.
Até agora, apenas a Conferência Episcopal do Japão se mostrou muito preocupada com o rumo do Governo do Japão nestes domínios. Quanto aos aliados ocidentais do Japão, mormente os Estados Unidos, nem uma palavra ou um gesto simbólico de preocupação e de reprovação. O mais provável, pois, é ter razão o Papa Francisco, quando refere estar-se já em plena Terceira Guerra Mundial, embora a decorrer aos pedaços.
No meio de tudo isto, decorrem entre nós as mil e uma batalhas, e também pequenas guerrinhas, ao redor dos dois atos eleitorais que se avizinham. Sem e com espanto, eis que nos nos surgiu ontem Henrique Neto, salientando não ser normal que um país tão pequeno tenha em prisão preventiva, ou já condenados, ou à espera de decisão judicial um primeiro-ministro, ministros de vários executivos, um antigo líder de uma bancada parlamentar, diretores-gerais e outros altos quadros do Estado.
Reforçou esta sua ideia, salientando que nenhum outro país europeu, mesmo nos maiores, tem um conjunto tão grande de pessoas a contas da justiça como se dá com Portugal. Ou seja, Henrique Neto olha o problema em causa à luz de regras puramente estatísticas e não culturais. Para Henrique, teríamos sempre de entrar para a União Europeia e de adotar o euro, dado que uma grande maioria de Estados assim havia procedido. Terá por igual assim pensado também com o destino a dar às nossas antigas províncias ultramarinas. Nunca lhe ocorreram os argumentos de Salazar com amigos seus, a este propósito, e que nos foram expostos na mais recente obra dirigida por Filipe Ribeiro de Menezes. Enfim, uma pequena pândega. E tudo, pois, sempre com os olhos postos nesse altíssimo desígnio do combate à corrupção. Um êxito!
