Neoliberalismo e corrupção

|Hélio Bernardo Lopes|
Durante décadas recusaram-se dados que eram objetivos e muito simples de perceber. Um deles foi a evidente entrada de estupefacientes na Europa, através, primacialmente, de Portugal, e um segundo o facto de a corrupção ser uma realidade estrutural e omnipresente no seio da sociedade portuguesa.

Vi sempre com gosto todo um conjunto de supostos especialistas surgirem nas nossas televisões a explicarem a sua suposta razão: tudo seria idêntico ao que se passava lá por fora... Hoje, sabemos já que não tinham razão e conhecemos, como que em carne viva, a realidade que atravessa a vida nacional.

Acontece, porém, que a realidade que se procurava vender é hoje já autêntica, mas devendo ser lida numa perspetiva diferente: a corrupção, de mãos dadas com o empobrecimento geral dos povos, até da guerra no seio de tantos Estados, está por toda a parte. E, como sempre pude escrever – já lá vai quase década e meia –, tais realidades suportam-se – são mesmo fomentadas – por via do modo como a vida das sociedades está hoje organizada ao redor da valoração do lucro e da sua procura.

Essa procura desenfreada do lucro levou a que se procurassem criar as condições mais propícias ao movimento de capitais e sempre com barreiras mínimas ou a minimizar. E, como se vai podendo ver a cada dia que passa, parece que tudo nunca está bem nem é suficiente para quem procura riqueza e a pretende criar, sempre sem os olhos postos na promoção da dignidade humana.

Não custa perceber que os beneficiários queixosos destes dias nos venham apontar a dificuldade de regular um sistema financeiro global por máquinas de controlo que são nacionais e múltiplas, para lá de, naturalmente, estarem limitadas por algumas regras operacionais destinadas a salvaguardar (supostas) liberdades, direitos e garantias. Já dizia um velho anúncio que não se pode ter tudo por dois escudos.

Hoje, raros deixarão de concordar que a prática neoliberal que se vem desenvolvendo por esse mundo acabou por pôr em causa a economia dos Estados, a dignidade humana dos povos, a justiça, a democracia, a paz e o próprio equilíbrio e sobrevivência da Terra. Em contrapartida, grassam os negócios incontroláveis e seus desastres, com pesadas consequências para a felicidade expectável de milhões, desenvolvendo-se estruturas complexas, vastas e internacionais, ligadas à grande criminalidade, com a sua nuvem ampla de outsourcing. Grassa, pois, a corrupção e verdadeiramente por todo o lado.

O interessante de tudo isto é que no meu tempo do terceiro ciclo liceal, em plena II República e com Salazar no Governo, isto mesmo nos era explicado pelo nosso professor de Organização Política e Administrativa da Nação, que também nos ensinava Filosofia. As discussões, em plena aula e nos tempos de recreio, eram constantes ao redor desta evidência: quanto menor e menos corretiva for a intervenção do Estado, maior a pobreza e o abuso da maioria às mãos de uma minoria. Isto, caro leitor, era conversa semanal e aberta durante os tempos de aula daquelas duas disciplinas.

Hoje, ninguém duvida já do inferno a que o neoliberalismo necessariamente levará a generalidade dos povos do mundo. Nós, portugueses, temos vindo a ver, desde há perto de quatro anos, o preço terrível desta mais que evidente realidade. Ainda assim, continuam a existir os que asseguram ser este o melhor caminho. E como não haveria de ser assim, se até o racismo está a ressurgir um pouco por todo o lado, mormente nos Estados Unidos? E sabe o leitor o que lhe digo? Pois, que nunca na vida estive tão apreensivo como hoje...

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