Morreu o Leandro Vale. O silêncio incomoda!

|Luis Pereira|
Morreu o Leandro Vale, sabiam? Talvez não saibam, é natural. Afinal quem tinha por missão de levar a mensagem calou-se num torpe e incomodativo silêncio, num triste e lamentável silêncio, que tão transparente é.

É transparente este silencioso descuido de não noticiar, porque deixa transparecer a translúcida concepção do jornalismo pacotilha que me incomoda, como me incomoda, e tanto me incomoda, este silêncio gerado à volta da morte de Leandro Vale.

Morreu o Leandro Vale, sabiam? Talvez não saibam, porque não houve o raio de um meio de comunicação local ou regional ou nacional, ou...sei lá… planetário, que o tivesse noticiado. Quer dizer, houve apenas um jornalinho, um jornalinho tão livre e independente e politicamente tão incorrecto como o Leandro o foi, que deu a notícia. Sim, foi esse, foi este, fui eu que através do Notícias do Nordeste anunciei publicamente a morte do Leandro Vale; eu e mais alguns amigos do artista que numa última homenagem espalharam a notícia, aos pouquinhos, gota a gota, pelas redes sociais.

Os outros jornais, os grandes jornais, os jornais assim, assim,  os jornais subsidiados e medíocres, os jornalecos e jornalinhos que andam sempre de chapéu na mão calaram-se; calaram-se como que envergonhados de dizer, de homenagear de, pelo menos, cumprir a missão de informar.

Morreu o Leandro Vale. Não sabes? Não soubeste?! Achas que isso não é notícia?! Achas que a morte de um dos mais proeminentes e empenhados animadores culturais da região não merece um necrológico, um apontamento, um parágrafo, uma frase, uma palavra para o teu vasto auditório?!

Morreu o Leandro Vale. Esse mesmo. O fundador do Teatro em Movimento que depois de uma longa e enriquecida carreira como actor, encenador e dramaturgo, teve a sã ousadia de fundar um grupo de teatro profissional em Bragança, de levar o teatro às aldeias, de levar a cultura ao povo. Povo. Talvez seja essa a palavra maldita que o Leandro amou. O Povo, a Liberdade e a partilha.

Morreu o Leandro Vale. Morreu o artista maior num silêncio tolheito, forçado, mesquinho. Morreu o Leandro Vale, esse mesmo, o líder da companhia do Teatro em Movimento que um dia teve a coragem de processar o Ministério da Cultura por este se ter esquecido da sua missão, do seu labor e da sua luta numa terra de pessoas coniventes com o silêncio e o esquecimento. E vejam só, o Supremo Tribunal Administrativo acabou por lhe dar razão num recurso apresentado em relação à atribuição dos subsídios às companhias teatrais. Bonito! Foi bonito de ver e sentir a razão de uma pequenina mas atrevida companhia de teatro do interior a colocar no devido lugar as "inquestionáveis" e "sábias" decisões da administração centralista. Só por isso, se outras e mais profundas razões não houvesse, Leandro merecia ser recordado!

Morreu o Lenadro Vale. Esse mesmo, o jornalista e o escritor de quem se pode dizer que quase não há meio de comunicação regional onde não tivesse escrito ou dito um texto. Mas mesmo assim, Leandro partiu em silêncio, com silêncio, com um incomodativo silêncio, como se todas as fichas técnicas das publicações onde o artista escreveu ou falou tivessem sido rasuradas para se esquecer o seu nome.

Silêncio. Triste e profundo silêncio. Um silêncio que incomoda,  porque o  Leandro inquietou!

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