Porquê o espanto?

|Hélio Bernardo Lopes|
Num certo sentido, já nada me espanta de quanto se passa no seio da sociedade portuguesa. A verdade, porém, é que hoje mesmo me vi acometido de um espanto que não foi pequeno. Um espanto que me surgiu ao redor do espantos que a muitos assistiu por via das mais recentes declarações de Jorge Silva Carvalho, antigo líder do Serviço de Informações Estratégicas de Defesa, (SIED).

Jorge Silva Carvalho, nos termos do noticiado, alegou agora que as secretas acedem a dados pessoais, sendo que o (dito) Conselho de Fiscalização do Sistema de Informações da República Portuguesa, (CF-SIRP), nunca detetou um tal ilícito. Bom, caro leitor, fiquei verdadeiramente espantado – ainda consigo ficar assim...– com o facto de poderem existir deputados e académicos que possam mostrar-se como que alarmados perante uma tal realidade!

Não posso acreditar, como facilmente se percebe, que tais nossos concidadãos desconheçam o que vai pelo mundo, em geral explicado por via de documentários, entrevistas, ação jornalística, até mesmo declarações perante órgãos de soberania com poder de inquirir das mui frequentes violações da legislação em vigor em tais domínios. Não dá para aceitar uma tão flagrante ignorância.

Quando Jorge Silva Carvalho veio agora assumir práticas ilegais nas secretas, nomeadamente acesso a dados de comunicações, ele só o fez porque se lhe impôs defender-se com a verdade. Objetivamente, não dispunha de outro meio para poder defender-se. Simplesmente, se assim não fossem estas coisas em Portugal, o mundo estaria perante uma singularidade (quase) absoluta. Basta ver o que, ao longo de décadas, sempre se foi sabendo sobre as ações da CIA em plenos Estados Unidos, situações logo seguidas da demissão às centenas de funcionários da agência. E quem diz CIA, diz tudo o resto. Como se torna evidente, onde existe poder – e secreto...– há abuso de poder. Só não vê isto quem quer fazer-se passar por cegueta.

Malgrado tudo isto, também me vi atingido pela graça e pelo sorriso subsequente, por via de surgirem diversos deputados e constitucionalistas classificando de muito grave, alarmante e uma violação gravíssima do Estado de Direito que os serviços de informações nacionais cometam aquele tipo de ilícito. Para já, claro está. Mas como é possível uma tal admiração, se é universalmente conhecido que tudo isto – e tudo o resto – se passa por todo a parte do mundo, mormente nas democracias mais antigas?!

Por fim, o mais que expectável: Fernando Negrão quer agora ouvir o presidente do CF-SIRP, Paulo Mota Pinto, com o PCP já a salientar que vai chamar à Assembleia da República, para lá de Paulo Mota Pinto, o próprio Secretário-Geral do SIRP, Júlio Pereira, e com o Bloco de Esquerda a achar que é o Primeiro-Ministro, que tutela a secretas, quem deve responder a estas acusações. E que é feito do PS? E o Presidente da República?

Espero, com toda a minha sinceridade, que Jorge Silva Carvalho tenha a coragem de arcar com o sacrifício que também hoje vivem Julian Assange, Bradley Manning e o norte-americano que mostrou a todo o mundo o que realmente é a fantástica mentira da democracia norte-americana, que tudo e todos espia e por todo o lado. Uma realidade que varre aqui a NAS, a CIA, o FBI, etc.. E que os nossos políticos tenham a coragem de pôr um fim na cabal inutilidade das nossas secretas. Portugal não precisa de tais perigosas realidades.

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