O professor Delgado Domingos

Hélio Bernardo Lopes
Escreve diariamente
Faleceu há dias o Professor Catedrático Jubilado do Instituto Superior Técnico, José Joaquim Delgado Domingos. Nunca foi meu professor, até por ser da área da Mecânica e não da Engenharia Civil. Em todo o caso, conhecia bem o seu trabalho de maior impacto público e político, por via da sua porfiada defesa da sustentabilidade do nosso Planeta. Acima de tudo, pela sua luta contra deitar-se mão do nuclear em Portugal como fonte de energia.

Também nunca o conheci, embora o académico soubesse bem quem eu era. E, como muito bem escreveu há dias Viriato Soromenho Marques, Delgado Domingos era um cientista de causas. Era uma personalidade de inteligência superior e fulgurante. Fiquei com pena de não poder narrar em primeira mão o episódio contado pelo seu colega de Letras, ao redor daquelas erradas imagens sobre aves marinhas agonizantes, ao tempo da Operação Tempestade no Deserto. Tomei conhecimento delas logo no dia seguinte, sendo uma realidade que se tornou histórica o reconhecimento, por parte da CNN, da falsidade em causa.

Mas foi muito oportuno que Viriato Soromenho Marques tenha agora trazido este caso notável de Delgado Domingos, porque ele mostrou que é preciso estar atento ao que nos é contado na grande comunicação social e operar essa atenção com poder crítico. Delgado Domingos era, de facto, muito incómodo, fruto da sua inteligência, da sua boa moral e da sua coragem em defender a verdade, mormente ao redor da ciência e das suas aplicações.

Tal como refere Viriato, Delgado Domingos ascendeu, após concurso de provas públicas – e como era o mesmo vasto e complexo!...– a professor catedrático do Departamento de Engenharia Mecânica em 1965. Era ainda muitíssimo novo, mas já um valor completamente reconhecido.

Mas Delgado Domingos foi muitíssimo mais longe: fez escola – recordemos, por exemplo, Diamantino Durão e Maria da Graça Carvalho –; formou gerações sucessivas de engenheiros mecânicos; trabalhou com brilhantismo no seu domínio de investigação e na sua área; mas foi sempre um cidadão extremamente interventivo, mesmo já de antes da Revolução de 25 de Abril. Até nas suas aulas, nunca se coibiu de deitar por terra alguns bonzos de ouro que pululavam, então, na ciência portuguesa.

Claro que Delgado Domingos não era um ser supremo, ou disso próximo, tendo também incorrido em erros de apreciação em alguns casos. No cômputo geral, porém, ele deixou, indiscutivelmente, uma marca dificilmente apagável, tanto no Instituto Superior Técnico, como no domínio da cidadania, batendo-se contra perigosos modernismos que eram a ponta para grandes negociatas. Grandes e muito perigosas. Foi um acontecimento que me deixou triste.

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