Do cravo à ferradura

Hélio Bernardo Lopes
Escreve diariamente
Inquestionavelmente vive-se um tempo da mais cabal relativização. Passou a valer quase tudo, mesmo o abandono de cada um à sua sorte, morra ou sobreviva.


E desse modo se acabou por cair, na análise política televisiva de concidadãos de direita, num autêntico baloiço que oscila entre o cravo e a ferradura. Até António Bagão Félix consegue mostrar-se-nos atingido por este tique nas suas análises. Neste texto, porém, o centro da minha atenção é a intervenção de Luís Marques Mendes, neste passado sábado e ao redor do diálogo Durão-Constâncio em torno do BPN.

Assim, Marques Mendes salientou que não se devia transformar o caso BPN num caso de política, porque é um caso totalmente de polícia. É uma afirmação de aparência forte, porque dá a sensação de ser verdadeira. Simplesmente, Luís Marques Mendes esquece a origem ideológico-partidária da esmagadora maioria dos que vêm sendo investigados, como por igual atira para a Justiça a explicação final de tudo, como se tal seja uma realidade com probabilidade elevada de ter lugar. Esquece, sem mais nem menos, o corrupio de prescrições que aí está de novo e sempre sem consequências nem responsabilidades seja para quem for.

Depois, Marques Mendes opera esta fantástica afetação de responsabilidades: tanto Durão Barroso como Vítor Constâncio estiveram mal. Portanto, tão mal um como o outro... No fundo, Marques Mendes acha que Constâncio devia ter procedido como Jesus, dando a outra face. Esquece, naturalmente de um modo intencional, que foi Durão Barroso quem, fora de toda a lógica, foi buscar o caso BPN. Tem mesmo a lata de vir dizer que os dois deram uma imagem péssima a discutirem este caso em praça pública e sobre questões políticas, tudo não passando de oportunismo. Mas oportunismo de quem? Quem é que trouxe o tema para a praça pública, sem que para tal tivesse sido solicitado? E como é que se materializou o oportunismo de Constâncio? Defendendo-se de uma acusação trazida por Durão para a praça pública? É ridículo, e diz bem da estrutura de ética política da nossa direita.

Refinando a sua lata, Luís Marques Mendes salienta que Vítor Constâncio, ao afirmar que não se lembra de nada, foi pior a emenda que o soneto. E conclui: todos sabemos que Constâncio falhou redondamente na supervisão. A verdade é que assim não pensaram os decisores que escolheram Constâncio para dirigir a supervisão do Banco Central Europeu, nem o próprio Presidente Cavaco Silva, que no tempo adequado se encarregou de lhe atribuir um extremo elogio público. Quando o que se tem para dizer sobre o caso BPN é o que agora se ouviu ao antigo líder laranja, colhe muitíssimo melhor manter o silêncio. Sempre fica a dúvida sobre aonde terá já conseguido chegar ao redor do caso BPN, e que já (quase) todos os portugueses hoje conhecem de ginjeira.

Por fim, Luís Marques Mendes acha surreal Durão Barroso fazer inaugurações durante uma campanha eleitoral, esperando que o presidente da Comissão Europeia pondere a ideia. E tem razão. O problema é que também a abordagem do caso BPN foi surreal, sendo que a falta de ponderação na decisão vai agora manter-se neste caso das inaugurações. É caso para que digamos: a coisa é outra e a burra deita-se...

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