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| Hélio Bernardo Lopes Escreve diariamente |
Hoje, quando olho para estas quatro variáveis, constato que o escândalo de Guantánamo nunca foi resolvido, que o caso do serviço público de saúde – mínimo, diga-se – ainda hoje apresenta algumas limitações, que a situação económica norte-americana recebeu um bom sucesso, mas que, no plano internacional, a política de Obama tem sido omissa, ou resvalando mesmo para situações de pouca clareza, mas muito perigosas.
A tudo isto vieram somar-se as revelações de Edward Snowden, que nos permitiram ver, mas ao vivo, o modo como os Estados Unidos, de Obama e de sempre, tratam os seus principais aliados. Ou os que assim se vão considerando. Perante o escândalo mundial, e como já se havia dado ao tempo de Carter, Obama lá se viu obrigado a (aparentemente) assegurar que as coisas irão agora mudar. No entretanto, não existiram culpados de quanto o Mundo tomou conhecimento... Nem os países ocidentais, espiados e aviltados pelos Estados Unidos, tiveram a coragem de galardoar Edward Snowden por ter dado a conhecer a todos a verdade do dito Estado de Direito Democrático norte-americano, mas que não passa, de facto, de um Estado totalitário.
Por ser esta a realidade é que no meu texto, A ENTREVISTA DE MÁRIO SOARES, salientei, ao redor de ser Carlucci da CIA, já no tempo de PREC, que qualquer norte-americano tem sempre de prestar a colaboração que lhe for solicitada pelas agências norte-americanas de segurança. Não existe, nos Estados Unidos, a liberdade de recusar uma tal solicitação. Como se costuma dizer, vem nos livros e vê-se nos filmes.
A Barack Obama faltou, por exemplo, a capacidade para manter a Alemanha no devido lugar, evitando que esta e a União Europeia viessem a criar os acontecimentos antidemocráticos que tiveram lugar na Ucrânia. Um palco onde se estão a jogar duas grandes batalhas: uma económica, destinada a obter vantagens para a União Europeia na Ucrânia, outra religiosa, entre católicos e ortodoxos, tal como já havia tido lugar com a antiga Jugoslávia, com a Croácia a servir de ponta de lança contra a Sérvia, como já havia tido lugar durante a Segunda Guerra Mundial.
Isto mesmo pôde hoje ver-se na Ucrânia e em Moscovo, onde os Patriarcas Ortodoxos Ucraniano e Russo fazem leituras diferentes da realidade que está em causa. O primeiro, facilmente manipulável pelo Ocidente, referiu que o país que nos garantiu a integridade territorial cometeu uma agressão. Em contrapartida, o Patriarca Ortodoxo Russo salientou que se deve hoje rezar pelo povo russo que vive na Ucrânia, para que o Senhor possa fazer a paz na terra ucraniana, que acabe com os planos daqueles que desejam destruir a Santa Rússia. E é a realidade. Apontando que tal realidade já aconteceu muitas vezes na História, mas que ninguém conseguiu, o Patriarca Ortodoxo Russo salientou que a Ucrânia é politicamente um país estrangeiro, mas espiritual e historicamente nunca foi esse o caso, porque somos um único povo diante de Deus, temos a mesma fé ortodoxa. Até ver... Por isso referi, no meu texto, A ENTREVISTA DE DOMINGOS ABRANTES, a sua ausência de referências à questão religiosa central entre a Rússia, sovietizada ou não, e o Ocidente.
Esta é que é, de facto, a principal razão para a atitude provocatória da Alemanha e da União Europeia ao redor do caso da Ucrânia. O leitor deverá recordar aqui o grande apoio dado pela nossa Igreja Católica à comunidade ucraniana ortodoxa, naturalmente revestindo um objetivo proselitista. Uma realidade nunca noticiada, por exemplo, quanto às comunidades islamita ou ortodoxa russa, entre outras.
Por fim, a mais recente mancha negra na ação política de Barack Obama, que logo me trouxe ao pensamento o comportamento de Ronald Reagan: a lei que proíbe a entrada em solo dos Estados Unidos de qualquer representante nas Nações Unidas, incluindo o presidente, que tenha feito parte de atividades terroristas visando os EUA, ou os seus aliados, ou que possa representar uma ameaça para a segurança nacional norte-americana. Ou seja: vale tudo.
Revelando um despudor moral e político a toda a prova, Barack Obama referiu que atos de espionagem ou de terrorismo que visem os EUA ou os nossos aliados são, sem dúvida, da maior gravidade. Sim, caro leitor, Obama referiu expressamente atos de espionagem. Isto é dito pelo presidente do país que espia tudo e todos neste Mundo...
Acontece que a sede da Organização das Nações Unidas se situa em território dos Estados Unidos. Mas esta realidade, como se compreende, não pode ser um fator que impeça o funcionamento da instituição, ou o Direito Internacional Público ainda passaria a valer menos do que já vale. Por isso, os Estados Unidos são, em princípio, obrigados a conceder vistos aos diplomatas da ONU, segundo um acordo assinado em 1947 entre a Organização das Nações Unidas e Washington. Mas será que os Estados Unidos respeitam os acordos por si aprovados e ratificados? Claro que não, desde que assim lhes convenha.
Para os políticos norte-americanos, incluindo Obama, como se vê, la loi c’est à nous. Aquele acordo de 1947 estabelece que as autoridades norte-americanas não colocarão nenhum obstáculo ao trânsito, tendo como destino ou proveniência a sede da ONU, de representantes dos membros ou de funcionários da Organização das Nações Unidas, e seja quais forem as relações existentes entre Washington e o governo em questão. O grande problema é que, para os Estados Unidos, la loi c’este à nous... Uma realidade a que se adiciona a cobardia e a falta de qualidade política da generalidade dos dirigentes ocidentais.
No entretanto, na grande plutocracia que hoje são os Estados Unidos, o juiz militar de Guantánamo ordenou ao Governo norte-americano que informe os advogados de defesa sobre as prisões secretas e as técnicas de interrogatório da CIA, no âmbito do processo em preparação do presumível cérebro do atentado contra o navio USS Cole. Ou seja, os advogados nada sabem, ou talvez saibam tudo, mas sem poder provar. Ficam agora os cidadãos interessados do Mundo à espera de que sejam revelados os nomes, datas e locais das prisões secretas da CIA onde o saudita Abd al-Rahim al-Nachiri terá permanecido detido entre a sua prisão em 2002 e a sua transferência para Guantánamo, em 2006. E será que se vai saber por onde transitaram os tristemente célebres voos da CIA? Imagino as dores de cabeça, e de barriga, que por aí não devem já estar a desenvolver-se, para mais com a nossa maneira de estar na vida: não vi, não ouvi, não sei, não penso, obedeço...
