A história dramática de um homem que não tem recursos económicos para regressar à sua terra natal

Volodymyr Savratskyy precisa de ajuda para voltar à Ucrânia. Na freguesia de Beira Grande, em Carrazeda de Ansiães, mora um emigrante de 51 anos que por motivos de doença não pode trabalhar e necessita de ajuda para regressar à Ucrânia. Volodymyr Savratskyy, mais conhecido na freguesia pelo nome de “Miguel”, está há uma década em Portugal e perdeu o emprego o ano passado por sofrer de anasarça, uma condição clínica de acumulação de líquido generalizada.

Miguel encontra-se actualmente internado no Centro Hospitalar do Nordeste, em Mirandela. A 14 de Setembro de 2000 chegou a Lisboa para “ganhar euros” e, sem saber que tinha de assinar contrato de trabalho com seguro de acidentes de trabalho, acabou a trabalhar no Circo Chen. Na noite de 11 de Março de 2004, quando regressava a casa, foi esfaqueado na barriga.

“Apanhei a facada na Marinha Grande, à beira da fábrica de vidro, ao passar no outro lado da rua. Fui abordado por duas pessoas, que me perguntaram se tinha tabaco. Quando abri a bolsa e tirei o maço, meteram-me a faca. Graças a Deus, uma senhora passou e chamou a ambulância. [Roubaram-me] o passaporte, 150 euros e o telemóvel, que era a minha única forma de contacto”, recorda.

O incidente obrigou-o a um internamento de 17 dias no hospital, ao que se seguiu um período de recuperação em casa duma professora na Marinha Grande: “Uma senhora muito bondosa, de 60 anos, que muito me ajudou. Ela ajuda os pobres, lá na igreja, e ajudou-me com comida, comprou-me roupa”.

Nessa altura, o médico informou Miguel de que necessitaria de um ano para que o ferimento fechasse sem complicações. “Patrão queria trabalhadores, eu não podia”, pelo que perdeu o emprego no circo.

“Em Coimbra apanhei o comboio para o Porto. Tudo se passa na grande cidade, nas pequenas não se faz nada. Não me ajudavam, não tinha comida nem roupa. No Porto tem tudo. À noite dão mantas, roupa, comida, coffee [café], dormida. Toda a gente vai embora para a grande cidade porque tem tudo”, explica.

Durante mês e meio, um amigo cedeu-lhe abrigo e comida, no centro do Porto. “Mas o meu amigo tinha filhos, não podia estar sempre a ajudar, um mês chega”, pelo que “à noite dormia no Campo 24 de Agosto”. Isto até um outro amigo o levar para “uma casa que já não existe, junto à Ponte Luís I, no lado de Gaia”, onde havia “outros pobres a dormir”.

Foram “três anos assim, com mais umas 140 pessoas, tudo emigrantes”. Nesse tempo, continuou a procurar empregou e chegou a trabalhar como guarda-nocturno numa fábrica velha, em Gaia. “Meu amigo arranjou-me esse trabalho, mas com três meses e meio o patrão não pagou. Fui embora, que fazer?”

Já em 2007, “um amigo que tem o pai a trabalhar aqui [Carrazeda] perguntou-me se queria trabalho” e Miguel veio até ao concelho de Carrazeda de Ansiães, onde durante dois anos fez o que podia: “cortar erva na estrada, apanhar batata, tudo”. Ajudou quem precisava, mesmo com as dificuldades inerentes à doença que lhe aumentava continuamente o peso.

No último ano, começaram a agravar-se os sinais da anasarça, com ascite (acumulação de líquido no abdómen) e edemas nos membros inferiores. No início de Dezembro, “estava a jantar em casa, a ver televisão, e senti muito calor na perna. Levantei a manta e a perna arrebentou sangue. Pedi ao Tiago [Meireles] para chamar a ambulância e trouxeram-me para aqui”. Sem compreender o que lhe “estão a fazer” no Centro Hospitalar do Nordeste, Miguel acrescenta que estava previsto ter saído logo no dia seguinte, “mas não me conseguia levantar. Estava tudo inchado e tudo me doía”.

Apesar do internamento, Miguel continua em contacto com a família na Ucrânia, onde os pais, ambos com 71 anos, lhe pedem constantemente para regressar. O problema é que “o bilhete para voltar custa 430 euros” e Miguel, nos dez anos que está em Portugal, ficou sem tudo. “Lá [na Ucrânia] fica-se maluco e a mulher disse-me para eu vir trabalhar, ganhar euros. Mas não dá nada, o tempo passa e nada. Era preciso fazer contrato, seguro, eu não sabia”, lamenta.

“Para férias, provar vinho, passear, visitar, aqui é super. Para trabalhar, é igual. A comida é igual, tudo é igual, mais barato [na Ucrânia] só vodka e tabaco. Aqui tem é mais calor, ontem [dia 14] estavam lá 15 graus negativos”, afirma Miguel, que deixa mais uns valores para comparação: “Minha filha é médica e ganha 200 euros. Mãe telefonou-me ontem 10 minutos [e pagou] mais de 13 euros”. Para além dessa filha, de 20 anos, tem um filho de 19 anos que “trabalha no campo” e outro de 22 que ainda estuda.

“Minha terra, Ternopil, é mais perto da Polónia. Varsóvia [capital da Polónia] fica a 300 quilómetros, Kiev [capital da Ucrânia] já fica para o lado da Rússia. A minha terra ficava na Polónia. Meu pai é ucraniano, a mãe é polaca”, diz.

Miguel, Volodymyr Savratskyy de nascimento, não está arrependido de ter emigrado, mas sabe que está na hora de voltar à Ucrânia. O principal motivo é por a mãe ser “muito velha”, o que o deixa quase a chorar. Em Ternopil tem ainda um irmão à espera. “Vim aqui ganhar para voltar, dez anos e não ganhei nada. Quero ir para lá”.

Presidente de Junta dá o exemplo


O anjo-da-guarda de Miguel tem sido, nos últimos meses, o presidente da Junta de Freguesia de Beira Grande. Manuel Aníbal Meireles havia alugado uma casa a um conjunto de trabalhadores sazonais, entre os quais se encontrava o ucraniano. Depois de quatro meses em que tudo correu bem, os inquilinos deixaram de pagar a renda, a electricidade e a água e acabaram por ir embora. “O Miguel deixou de poder trabalhar e ficou lá sozinho”, lembra o autarca, que se condoeu com a situação do emigrante e começou a apoiá-lo com as despesas da casa. “A comunidade dava-lhe batatas, couve, azeite... Dentro das minhas possibilidades, também lhe dava batata, leite, açúcar, pão e de vez em quando carregava-lhe o telemóvel”.

“O trabalho dele foi sempre pouco, com o peso que tinha não conseguia trabalhar. Acabava por fazer o trabalho da casa, cozinhava, lavava a roupa, os outros chegavam e tinham a merenda feita, lá se iam entendendo. Quando os outros saíram é que ficou totalmente dependente. Nem sequer tem roupa, antes ele cosia a roupa para ficar mais larga, emendava camisolas com outras camisolas”, explica.

No dia 3 de Dezembro, o filho Tiago liga para Manuel Aníbal Meireles a informá-lo “do rebentamento duma ferida” na perna direita de Miguel, “estava a esguichar sangue”. O ucraniano foi levado para o Centro de Saúde de Carrazeda e daí para o Hospital de Mirandela. “Curaram-lhe a perna e deram-lhe alta no dia seguinte, mas passados três dias [terça-feira] voltou a chamar-me. Estivemos a conversar e disse-me que tinha os testículos inchados e que não conseguia urinar. Os bombeiros foram buscá-lo e ficou internado em Mirandela”, adianta.

Dê significado ao Natal e contribua

Perante a situação crítica de saúde e a vontade de Miguel em regressar à terra de origem, que ainda não aconteceu pela falta de dinheiro, surgiu o movimento de solidariedade organizado pelo presidente da Junta de Freguesia de Beira Grande, pela Direcção da revista Jfreguesia, pelo portal www.jfreguesia.com e pela Caixa de Crédito Agrícola Mútuo de Carrazeda de Ansiães.

O NIB da conta de solidariedade para com o Volodymyr “Miguel” Savratskyy é:
CCAM - 0045 2190 40240830855 68

Nesta quadra natalícia, é possível fazer com que Volodymyr Savratskyy possa sorrir uma vez mais e encontrar a família que o aguarda com saudade, a 3500 quilómetros de distância.

Texto publicado na íntegra com autorização do autor
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